Leia's lap dance


Star Wars é um dos meus filmes favoritos, mas, ainda assim, tem detalhes que me incomodam. A verdade é que, desde 1977, esta soap opera espacial estado-unidense tem vindo a revolucionar o cinema — foi um dos primeiros blockbusters da história e dos primeiros a vender merchandising, tendo uma fan base forte. 


Há, contudo, a meu ver, um pequeno problema — a Princesa Leia. Apesar de uma das minhas personagens favoritas, sofreu uma enorme sexualização e objetificação no grande ecrã e no merchandising. Trata-se de uma personagem forte e cheia de personalidade, mas o que se põe em causa é como foi recebida, vendida e transformada num objecto.


Durante os filmes, foi inúmeras vezes salva por figuras masculinas, acabando por ser reduzida a uma personagem menor, uma e outra vez, estando apenas no ecrã para polvilhar a visão masculina de uma figura feminina.



Tudo isto - objetificação da mulher - vai acabar por culminar no  popular traje sexualizado – é apenas um bikini dourado- de Slave Leia em The Return of The Jedi. Na verdade há cerca três mulheres em toda a trilogia principal e nenhuma delas toma decisões-chave que farão os rebeldes derrotar o Lado Negro. Inclusive, no final do filmes Leia tem nas mãos medalhas prontas a serem entregues aos grandes heróis – sim, homens, aparentemente, Leia não teve direito a uma medalha - que lutaram e venceram.

Quando os produtos Star Wars começaram a encher prateleiras eram maioritariamente das personagens masculinas e um ou outro de Leia mais sexualizada e próxima daquela boneca Barbie standard.


Um breve olhar ao cartaz do primeiro episódio pode garantir tristes gargalhadas ao observarmos Leia com uma roupa mais arejada, nunca vista nos filmes.


Depois de ler The Princess Diarist – último memoir de Carrie Fisher, aka Princesa Leia - e confrontá-lo com os textos que começaram a ser estudados em aula sobre a Barbie, esta objetificação da mulher fica ainda mais evidente.


Veja-se o que a actriz diz sobre a exposição no Madam Tussauds“The main thing you notice, though, about wax Leia is that I’m almost naked. (...) Everyone else got to wear their regular outfits from the first movie. I had to wear what that Jabba picked out for me” (p. 242-243).

Para além de ter tido de perder peso para os filmes, para ter o “corpo ideal” – aquele corpo de Barbie – ainda foi transformada em inúmeros bonecos-produtos de beleza – como a embalagem de champô Leia, em que basta rodar o pescoço para verter champô da forma mais perfeita e feminina possível. 

Eis o famoso champô

Para ganhar uns trocos, Carrie Fisher ia a convenções autografar fotos suas - as que mais detestava do bikini dourado - em troca de dinheiro, no que ela chamava de Leia’s lap dance. Pois é assim que funciona a Indústria.



Leia acaba por ser só uma cara bonita em todo o franchising e não ter o potencial que poderia mesmo sendo ela uma Skywalker, irmã gémea de Luke.


Leia teve a sua objectificação como nenhuma das outras personagens masculinas na série. A barbificação da mulher na Indústria da Cultura.


Vejam aqui mais alguns produtos.


Patrícia Cândido, 52119

Comments

  1. Isto é um tema que se alastra a outros elementos culturais da actualidade, como, por exemplo, videojogos. Consigo ver uma certa semelhança entre a personagem Leia - bem analisada pela colega - e a personagem Lara Croft, do jogo "Tomb Raider". A sua objectificação é chocante. A concepção corporal de Lara Croft ultrapassa todas as barreiras da desproporção. A sua cintura e pernas são finíssimas, o que contrasta com o tamanho dos seus seios e ancas; e, como acontece no exemplo dado pela colega, as roupas escolhidas deixam a personagem muito próxima da nudez. Contudo, como a roteirista do jogo, Rhianna Pratchett, revelou, a sexualização da personagem para fins publicitários está no passado. Após incessantes críticas à objectificação de Lara Croft, que afectava o seu papel de guerreira e a reduzia a uma mera fantasia sexual sem credibilidade como heroína, a mais recente versão do jogo conta com uma Lara Croft cuja construção corporal é muito mais realista e com roupa adequada para os obstáculos que tem que contornar ao longo do jogo. Deixo aqui um link com uma imagem que agrupa a evolução da personagem: http://fiqueligado.com.br/public/img/carla/laura5.jpg

    Creio que este seja um final mais feliz na luta contra a "barbificação" (como diz a colega) da figura feminina do que o da história da princesa Leia.


    Inês Morais, 146160

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  2. Não sabendo muito sobre "Star Wars", consigo na mesma identificar-me com a princesa Leia, fazendo-me esta lembrar as incontáveis Barbies que tive que são representadas exatamente da mesma maneira. Ambas estas personagens são sexualmente objetificadas, sendo que os seus corpos e as suas maneiras de vestir só servem para satisfazer desejos e fantasias dos homens que as criaram. O problema disto é que muitas raparigas, sejam crianças, no caso das Barbies, ou adolescentes, no caso da princesa Leia, tomam estes objetos como exemplo a seguir e isso é extremamente preocupante. Estas mulheres que serão o futuro do nosso mundo, crescem a ser influenciadas constantemente por estereótipos que só servem para acabar com o auto-estima. Elas ficam com a necessidade de seguir estes modelos que são completamente irreais, porque sabemos que se existisse uma mulher com as mesmas medidas que a Barbie, ela não conseguiria manter-se em pé. Além disto, existe outro problema, estas bonecas estão sempre a ser comercializadas, não só em brinquedos, mas em imensas outras indústrias. Portanto, este ideal de ter que ser algo que não somos, está constantemente a ser perpetuado e não conseguimos fugir disso porque cada vez que compramos alguma coisa, é essa ideia que estamos a comprar. Quando recebia uma Barbie nova, em criança, juntamente com ela recebia um filme sobre essa Barbie, onde se contava a sua história. As histórias eram todas iguais e a Barbie era sempre princesa. Isso influenciou-me profundamente, tornando um dos meu maiores desejos querer ser uma princesa. Aqueles filmes faziam-me acreditar que isso realmente poderia acontecer. Quando percebi que isso nunca iria acontecer fiquei realmente desiludida e agora que estou a refletir, percebo que os únicos valores que a Barbie ou mesmo a princesa Leia transmitem são falsos. Para mim, é muito triste pensar que estas raparigas, devido a estes objetos, caiam no mesmo erro que eu e só tenham como objetivo ser princesas, quando o que conseguimos alcançar é muito maior que isso.

    Melanie Rodrigues, 146256

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  3. Viva, Patrícia, Inês e Melanie! Grata pelas vossas reflexões. Na verdade, a consciência é aquilo que poderá alterar a reificação de género proposta pelas indústrias da cultura. Se / quando vocês forem mães, estou certa de que serão atentas a este tipo de detalhe, ao escolherem os brinquedos das vossas filhas.

    Curioso como a entrada destas personagens femininas no mundo do heroísmo masculino obedece ainda a uma visão misógina; aquilo que parece (e em muitos aspetos é, de facto) uma conquista, quando analisado sob a perspetiva feminista acaba por ser visto como a perpetuação de uma série de estereótipos de género. Dá que pensar.

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  4. Tal como a Patricia, também eu sou uma enorme fã da saga Star Wars. De certa forma nunca tinha pensado de forma consciente como de facto a personagem Leia apesar de representar uma mulher forte, firme e decisiva na luta dos seus objetivos, acabava por ser ''ridicularizada'', nomeadamente na cena em que aparenta usar o tão famoso bikini.
    Na verdade, penso que para muitas mulheres, ainda nos dia de hoje, a personagem Leia representa força e uma espécie de esperança para combater os problemas do dia-a-dia, os stresses, as desigualdades. Contudo, é pena que esta imagem de ''mulher forte'' tenha que vir associada a uma imagem sensusal, a um determinado tipo de corpo e roupas.
    Para além da personagem Lara Croft como indicou a colega Inês, existem muitas outras que sofrem desta mesma ridicularização. Alice de Resident Evil, tanto nos jogos como nos filmes aparece tal como Lara Croft com roupas justas, favorecendo as curvas e o peito.
    Se pensarmos bem, personagens fictícias como as Navegantes da Lua, que acompanharam grande parte da minha infância, ou até mesmo nos filmes da Disney, e por trás de toda a magia das histórias, conseguimos retirar ideias que vão de encontro ao mundo em que vivemos, nomeadamente no que diz respeito a esta imagem da mulher. Tanto a personagem Pocahontas como a cigana Esmeralda (da história do Corcunda e Notre Dame) representam isto mesmo.
    Todas elas são mulheres fisicamente bonitas e poderosas, todas usam roupas super desconfortáveis como saias, salto alto até mesmo quando precisam de lutar ou sobreviver ao fim do mundo. O cabelo está sempre impecável e a maquilhagem impecável, contudo, elas nunca se igualam aos homens. Todas poderiam facilmente ser capa de alguma revista de moda pois elas reforçam o padrão de beleza e de como todas as mulheres deveriam ser.
    É realmente triste a sociedade de hoje em dia se ‘’reger’’ por esta ideia nomeadamente no cinema, pois acho que é importante começar-se a dar mais importância a personagens como a Hermione da saga Harry Potter e não tanto a esta ideia ‘’sexual’’ da mulher.

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    1. Só venho aqui dizer que a cena mais irrealista do Mundo Jurássico foi a mulher andar o filme todo de saltos.
      - Patrícia Cândido, 52119

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  5. Adorei o teu post, como grande fã da saga Star Wars concordo com tudo o que disseste. A personagem Leia merecia muito mais. Outro ponto é que ela é uma Skywalker e nunca é vista como uma jedi (neste caso, alguém capaz de salvar a galáxia da força negra), enquanto que Luke é idolatrado como tal em toda a saga. Porém, os directores andam a mudar isso. Os dois últimos filmes da saga, The Force Awakens e Rogue One, são protagonizados por mulheres, ambas o principal da história e controladoras do enredo.

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    1. Oi! Obrigada :) Concordo. E ainda bem! Se estiveres interessado, a Leia como Jedi está a tornar-se cânone nos novos livros: Aftermath. Uma prova dos pequenos ventos da mudança :)

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  6. This comment has been removed by the author.

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